RSS

Ódio Eterno

Na fé em quê? No amor a quê? Na esperança de quê?... Estes fracos, não tenhamos dúvidas, também querem chegar um dia a ser eles os fortes. Um dia, dizem, há-de chegar o seu «reino»... Repita-se, o «reino de Deus», como eles tão simplesmente dizem..., tão humildes que são, em tudo! Só para chegar a viver isso já é preciso viver muito, viver para lá da morte... É mesmo necessário que disponham da vida eterna para — eternamente e no «reino de Deus» — poderem ressarcir-se desta passagem pelo mundo, vivida «na fé, no amor, na esperança». Mas ressarcir-se de quê e por intermédio de quê?... Quer-me parecer que Dante cometeu um erro grosseiro ao colocar sobre a porta do seu Inferno, com uma ingenuidade que mete medo, aquela parte da inscrição: «... também eu sou criação do eterno amor.»* Com melhores razões poderia estar sobre a porta de entrada para o paraíso cristão e para a respectiva «beatitude eterna» uma inscrição dizendo: «também eu sou criação do ódio eterno...»


* Dante, A Divina Comédia, «Inferno» III, 5-6

Friedrich Nietzsche, Para a Genealogia da Moral