Houve o debate. Houve os comentadores do debate. Houve os comentadores dos comentadores. E assim por diante. A verdade é que, num balanço tão apertado como aquele a que assistimos, as opiniões dependem mais daquilo que se quer ver do que daquilo que na realidade se viu. Por exemplo, o omnipresente LuÃs Delgado, que tem andado nervosÃssimo por causa de não saber o que o futuro que lhe reserva, achou que Sócrates estava nervoso e nada mais lhe interessa.
O mais provável é que a sondagem de 120 entrevistas telefónicas realizadas pelo "Correio da Manhã", e que deu 50,4 a considerar a vitória de Sócrates, e 20,2 a achar que Santana era vencedor, corresponda acima de tudo aos desejos e expectativas dos eleitores. De qualquer forma, confirma o que tem sido o balanço das grandes sondagens e atribui ao PS uma maioria absoluta.
Extremamente divertido foi o tÃtulo que os jornalistas do PÚBLICO escolheram para a primeira página do jornal: todos consideram que o debate foi morno, demasiado técnico e teve pouco sangue, mas esperava-se tão pouco de Santana que o facto de ele ter ultrapassado as expectativas acabou, dizem eles, por lhe dar uma vitória. O critério parece insustentável, mas funciona em termos positivos para o ainda primeiro-ministro.
Pessoalmente (mas tenho de considerar o enviesamento suscitado pelos meus próprios desejos) estou de acordo com o juÃzo de Miguel Sousa Tavares: Sócrates ganhou aos pontos. É verdade que Santana Lopes se mostrou mais bem preparado do que seria de esperar, mesmo que nos seja difÃcil avaliar a credibilidade dos números debitados. Em termos retóricos, não interessam que números, mas, sim, o efeito técnico de dizer números. Ouvimos e dizemos: este rapaz domina os números, não é tão tonto como parece. Os números opõem-se ao disparate quotidiano, no qual Santana Lopes é pródigo. Sem explicar coisa nenhuma, veio agora dizer que não contava com Bagão Félix no próximo governo, dando origem a uma reacção de Paulo Portas, que tinha designado Bagão como ministro do "governo sombra". Mais uma vez se prova que a coligação está de pantanas e que, sem a intervenção de Sampaio, não teria durado uma dúzia de semanas.
Mas há um tópico que se tornou recorrente: Sócrates frio, Santana quente. Não nego que existe neste contraponto algo de verdade. Mas alguns aspectos da forma televisiva contribuÃram para isso. Em primeiro lugar, Sócrates cometeu o erro (que nenhum assessor corrigiu) de não olhar para as pessoas, mas para os jornalistas. Faltou o afecto de um face-a-face. Em segundo lugar, nas imagens finais, os realizadores da SIC fizerem um movimento lento de aproximação dos olhos de Santana, potencializando a emoção. Os espectadores sentiram-se tocados por alguém que os olhava de frente. E assim se converteu um troca-tintas profissional num homem com o coração ao pé da boca.
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