RSS

Canto

Canto porque estou vivo e amarrado à condição de ser fiel e agreste.
Porque em vão nos destroem a memória com máquinas, rodísios, honorários.
Porque o sol torna fulvo o teu cabelo e apetecem meus lábios os teus seios.

Canto a tua coragem, general, confinado na prática e fora dela. Canto
como quem morde, ofende, esmaga e, exausto, resiste e sobrevive.

Canto para saber que vale a pena ter voz, músculos, nervos, coração.
À mesa do café, nas ruas, canto.
Nos jardins, nos estádios, sofro e canto.
No quarto abandonado, sonho e canto.
Nos pequenos cinemas, rio e canto.
Entre teus braços doces, choro e canto.

Descerro a aurora com palavras graves, cantando.
Reinvento a melodia, o sol aberto, o amor pelas esquinas, a marca
sensual nos ombros nus,
a memória da infância, a tua face - e canto.
Inutilmente embora, canto.

Daniel Filipe