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CARTA A UM MENINO QUE NÃO NASCEU( continuação)

...Como se fosses um embrulho.
E quando, com a maior serenidade lhe expliquei que a minha intenção era completamente diferente, embrenhou-se num infinito discurso em que as súplicas se misturavam aos conselhos , os conselhos às ameaças, as ameaças à lisonja.
« Pensa na tua carreira, pondera as responsabilidades, podes um dia arrenpenderes-te, que dirão os outros!»
Deve ter gasto uma fortuna naquela chamada...., concluiu que poderiamos suportar a despesa a meias: ao fim e ao cabo eramos « ambos culpados». Cheguei a ter vómitos. Tive vergonha por ele. E desliguei, lembrando-me que o tinha amado.
Amado? Ainda um dia havemos de conversar um pouco a respeito dessa coisa a que se chama amor....Não penso em ti em termos de amor . Penso em ti em termos de vida....talvez seja verdade aquilo que a minha mãe sempre disse que o amor é o que uma mãe sente pelo seu menino quando o toma entre os braços e o sente sózinho, inerte, indefeso...
...Mal chego a casa, pego naquele jornal, conto os dias ,a tua idade, e procuro-te. Completaste hoje seis semanas. Como te tornaste bonito! Já não és peixe, nem larva, nem coisa informe, pareces já um ser humano...
O médico disse-me que lá voltasse passadas seis semanas. vou amanhã....Num tom que oscilava entre o solene e o alegre ergue uma folhinha de papel e disse » Parabéns, minha senhora». Automáticamente corrigi: » Menina». Foi como se lhe tivesse dado uma chapada...e fitando-me com uma indiferença intencinal, respondeu: » Ah!» . Depois pegou na caneta, riscou «senhora » e escreveu « menina»...Tanto o médico como a enfermeira comportavam-se como eu lhes fosse antipática. .Quando me deitei na marquesa, a enfermeira irritou-se comigo por eu não ter afsatado as pernas e não as ter apoiado nos suportes de metal. Fê-lo ela...Senti-me ridicula e vagamente obscena...O importante era não fumar demasiado, não fazer esforços exagerados, não pensar em soluções criminosas. « Criminosas ?» perguntei atónita. E ele : » É proibido por lei. Lembre-se disso!»...


(Continua)