La Feria e Shakespeare
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Esta crónica não é acerca da concessão do Rivoli aos negócios do tal La Feria, ou, como melhor diria o outro, "ceci n'est pas une pipe".
Esta crónica é sobre a língua portuguesa.
Porque o comunicado da Câmara do Porto que anunciou a boa nova após "um aturado processo de selecção" (cuja demora, tudo o indica, terá resultado da justificada expectativa de que a Floribella também se candidatasse) escreve enfaticamente, na língua de Camões e de Margarida Rebelo Pinto, que La Feria garante "uma programação apelativa de elevada qualidade".
Rui Rio tem, como é sabido, um tortuoso conflito com a língua portuguesa, manifestado espasmodicamente em processos judiciais em torno de palavras que, no seu dicionário privado, ganham asas e partem por aí fora em inesperadas e emocionantes expedições semânticas.
Mas usar o nome comum, abstracto, não contável, não animado e não humano (começo a acomodar-me sobressaltadamente à TLEBS) "qualidade", ainda por cima "elevada", a propósito da "programação apelativa" que La Feria promete para o Rivoli coloca, mais do que um problema linguístico, um problema de saúde pública.
Se La Feria é "elevada qualidade", temo imaginar o que seja, no dicionário de Rui Rio, "baixa qualidade".
O mais certo é que seja Shakespeare.
( Manuel António Pina, in JN 2006.12.19 )
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