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O PIÃO

Pois é, depois dos rebuçados Victória volto a este espaço aprazível para falar de um brinquedo que muito nos era querido naquela fase pré e pró 25 de Abril. Naqueles tempos em que brincávamos nas ruas, nos terrenos baldios que não faltavam - eram aos montes, acrescento - e que cada brinquedo tinha a sua época, consoante o clima, a própria conjuntura. Ou não era assim? Jogava-se à sameira ( termo tripeiro de carica) imitando a volta a Portugal em bicicleta, com decorações em desenho no interior com as cores do Sporting - claro, o nosso Joaquim Agostinho - do Benfica - Fernando Mendes na liderança- do FC Porto - Joaquim Andrade e outos,- do Sangalhos - pois, o Venceslau e Herculano de Oliveira - dizia eu que se jogava à sameira com pistas feitas na terra ou no areal da praia, com metas volantes, prémios da montanha e até o poço que fazia com que quem nele caísse voltasse ao risco de partida, no tempo do ciclismo, em pleno Verão. Mas noutro texto falarei das ciclísticas divergencias e da multiplicidade de brincadeiras que com isso arranjávamos. Ou melhor, criávamos...
O pião vinha depois da sameira, ou carica como quiserem, que o português é rico em termos, definições e sinónimos de região para região. Ali perto do final do Verão, mesmo, mesmo, ao aproximar do começo das aulas, depois dos três meses de férias - que maravilha!-e descanso de muito aprender e decorar( a linha do Norte, do Tua, da Beira, não litoral ou interior, mas Beira de Moçambique ou os rios de Portugal, mais o Quanza de Angola ou o Zambeze de Moçambique, as coisas que sabíamos e que agora acham errado). Começava o pião, pois então, porque era a época dele, não havia um dia destinado, começava como por acaso, porque tinha de começar, quase sempre quando as primeirs e ténuas gotas de chuva caíam sobre a terra seca, e o pó exalava, nessa mistura gotal, um odor único que enche de nostalgia a quem por isso passou, a quem isso viveu.
O pião! Aquele objecto que se vendia ou nas romarias ou nas drogarias que tinham de tudo um pouco, até ratoeiras ( vejam como chamávamos) de pardais. Ratoeiras são de...ratos, mas para nós eram ratoeiras de pardais ( também lá irei um dia).
E lá chegava o pião. Naturalmente. E a malta surgia apetrechada. Uns com piões novos, bico afiado, outros com o velho, do ano passado, mas que dava sorte, era um campeão. E começava a jogatana, ou melhor, a guerra do pião.
Jogava-se à rodinha. Às quecas também( atenção nada de confusões). Eram momentos sublimes. O silvar da faniqueira ( o cordel que acciona o pião, tenho de explicar tudo porque se calhar alguns dos curralenses passaram ao lado disto) era único, o barulho característico do pião a girar também e então aquele gesto da apanha, entre dois dedos de uma mão, com o qual levavamos o pião junto ao ouvido para o escutar a zunir. Como zunia!!!
A guerra era nas quecas. O perdedor tinha o pião colocado no chão, coitado, à espera que o outro impulsionado pela força do dono lhe caísse de bico de ferro em cima e lhe tirasse um pedaço de madeira, como se o descascasse e nós lá dizíamos em euforia: " eh pá, grande queca, saiu chicha para caraças!"
Era assim até se rebentar com um, com outro e mais outro! Chegados a casa e quando nos atrevíamos a pedir mais um pião, que nos tinham partido o nosso a jogar às quecas, lá vinham primeiro a bofetada e depois o sermão: " è sempre a mesma coisa, estragas tudo. Agora só tens pião para o ano!"
Nova brincadeira estava prestes a entrar no seu e nosso ciclo de vida!

3 koices:

Tito disse...

Simplesmente FANTASTICO, especialmente para a minha geração. Ler isto foi uma viagem no tempo, apreço de low cost mas saboroso como um pitéu. Obrigado por me fazeres sentir menino...

Anónimo disse...

Adorava jogar ao pião. Eu até os pintava e adorava ver o efeito das cores quando ele rodava!!!!
Quem não se lembra do jogo do elástico, do mata(a bola era feita de meias velhas) ,da macaca,dos carrinhos de rolamentos(era cada tombo nas curvas)....

Ze Manel disse...

Que espectaculo!!

...e mais: Havia quem lançasse à menina(por baixo), ou à homem(por cima)!! hehehe...

Já agora: O queridinho apanha o pião na unha do polegar direito! Nunca vi ninguem fazer aquilo, nunca.. E ainda hoje o deve fazer!!

1 Abraço Freitas!

Tito disse...

Simplesmente FANTASTICO, especialmente para a minha geração. Ler isto foi uma viagem no tempo, apreço de low cost mas saboroso como um pitéu. Obrigado por me fazeres sentir menino...

Anónimo disse...

Adorava jogar ao pião. Eu até os pintava e adorava ver o efeito das cores quando ele rodava!!!!
Quem não se lembra do jogo do elástico, do mata(a bola era feita de meias velhas) ,da macaca,dos carrinhos de rolamentos(era cada tombo nas curvas)....

Ze Manel disse...

Que espectaculo!!

...e mais: Havia quem lançasse à menina(por baixo), ou à homem(por cima)!! hehehe...

Já agora: O queridinho apanha o pião na unha do polegar direito! Nunca vi ninguem fazer aquilo, nunca.. E ainda hoje o deve fazer!!

1 Abraço Freitas!