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A atracção da ribalta

Tudo começou quando o presidente do Benfica anunciou, com a compreensiva cobertura da Imprensa, que tinha descoberto à porta de sua casa um dossier "anónimo" com "informações relevantes" sobre o fantástico mundo do futebol e, em especial, sobre o "Apito dourado". Os "incertos", como se usa escrever nos autos, não quiseram entregar o seu documento à Polícia, aos tribunais ou ao Governo; confiavam mais no presidente do Benfica, que lhes oferecia mais garantias. Assim vai o Mundo.
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Ora, como se sabe, um dossier "anónimo" é um dossier que não tem assinatura ou lhe falta assinatura, pura e simplesmente, ou a apagaram para que seja "anónimo". Por exemplo: alguém pode elaborar um dossier "anónimo" e, para lhe dar credibilidade (imagine-se!), é necessário retirar-lhe a assinatura; imagino que, se a tivesse, ninguém ligaria. Sem assinatura (esse sinal infame que indica o nome do acusador, do denunciante, do queixoso, do mentiroso, da vítima ou do interessado), o documento ganha muito mais credibilidade.
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Simplesmente, procuradores, polícias, investigadores anónimos e diligentes funcionários dos departamentos criminais, em vez de chamarem o pessoal do CSI de Las Vegas, para encontrarem impressões digitais, manchas de uísque, pingos de sardinha e de caldeirada, ou cabelos sujos, sentam-se nos seus gabinetes (vá lá, é uma imagem literária), ajeitam os óculos, empilham uma série de blocos para apontamentos ao lado de uma dúzia de lápis afiados, e iniciam a leitura. Fazendo a vontade aos autores dos dossiers "anónimos", ou a quem lhes retirou a assinatura, deixam na opinião pública a ideia de que a denúncia anónima, a falta de escrúpulos, a chantagem pessoal e a literatura de vingança mais abjecta são instrumentos da justiça ou da procura da verdade.
É evidente que este exemplo pode frutificar. Ele pode trazer benefícios evidentes, quer à indústria de entretenimento quer ao negócio do papel impresso. Centenas de autores de dossiers "anónimos" estão disponíveis para continuar este trabalho e para exigir leitores na Polícia e nos gabinetes de investigação criminal. Romancistas falhados, burladores profissionais, delatores de vizinhos, mentirosos encartados ou patifes banais estão agora autorizados a escrever os seus textos. Vinte, trinta páginas bastam para aceder à glória. É uma alegria. O dossier "anónimo" está na moda.
Convido-vos à escrita.
( "A credibilidade do anonimato", Francisco José Viegas, escritor - para ler na íntegra in JN 2007.08.20 )
( imagem in Garamblog )