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O COMPROMISSO FINAL


« Isacc»

Lembras-te quando brincávamos os dois? Lembras-te quando te mostrava mapas e fotos e te dizia onde tinha estado e o que tinha feito? Lembras-te das perguntas que te fazia para te ajudar a seres rápido e para te pôr à prova?
Gostaria de te dar um abraço, irmão. Estive pouco presente.Mas faço o melhor. Para todos.Para mim.
Vou fazer-te a última pergunta da minha vida. Tens muitos anos para responder não te esqueças dela. Pensa nela.
Sabes o que faz um homem com um garfo numa terra de sopas?
Se um dia encontrares a resposta, grita-ma.
Ouvir-te-ei. Eu já a conheço, mas enquanto para mim é tarde, para ti ainda não é, nunca será.
Isacc, não sejas demasiado severo quando me julgares. Lamento-o acreditar-me. Lamento-o muito mais do que possas imaginar.Não fujo por cobardia.À falta de melhor, faço-o por dignidade, mas nunca por cobardia.
Perdoa-me.Não é uma fuga, nem um abandono.Há coisas que, simplesmente, são como são e não as podes mudar. Pela minha memória, por favor, procura ser melhor jornalista que possas, e também o mais honesto. Neste mundo a honestidade é a única coisa que nos diferencia uns dos outros. Uma pessoa honesta é uma pessoa boa.Gostaria de te dizer mais qualquer coisa, mas não posso.
Pelo papá , pela mamã, por ti. Não posso. Não me esqueças Isacc. Gosto muito de ti»

(.....)
- Já sei o que faz um homem com um garfo numa terra de sopas, Cheme- murmurou com algo mais de que terna amargura.-É tão simples que me parece ridículo, mas suponho que todas as grandes verdades são simples- olhou fixamente a lápide e acabou por dizer:- Um homem com um garfo numa terra de sopas, bebe e come com as mãos, porque o garfo não lhe serve para nada nem nunca lhe irá servir. E essas mãos são tudo o que tem, da mesma maneira que o ser humano na vida apenas tem a sua honestidade para viver. Há muitas terras cheias de sopa, carregadas de cores, convidando-te com cantos de sereias, oportunidades, êxitos, luxos... mas a única escolha para apurar a existência reside em nós mesmos. Mãos e coração. Não te esquecerei, prometo-te.
Não precisou de gritar, como lhe tinha pedido Cheme na sua carta póstuma. Sabia que o podia ouvir, do outro lado da lápide ou onde estivesse.

Um homem com um garfo numa terra de sopas

Jardi Sierra i Fabra